sexta-feira, 11 de setembro de 2009

O DILEMA DO CHICOTE

Reginaldo de Oliveira
E-mail - reginaldo@reginaldo.cnt.br

Publicado no Jornal do Commercio em 03/09/2009 – Manaus/AM - Pag. A3
www.artigo25.rg3.net

Uma sequência do grandioso filme Ben Hur, do diretor William Wyler, mostra uma embarcação movida pela força de vários homens que aparentemente remam sem parar. Há também um homem que dá ritmo às remadas tocando um tambor e ou outro que garante por meio de chicotadas que o ritmo permaneça inalterado. A imagem de vários homens trabalhando sob sucessões de chibatadas revolta o espectador, sem que se pense que o chicoteador está ali cumprindo a sua função. Ou seja, chicoteando aqueles que não acompanham o ritmo e prejudicam o desempenho global do trabalho. O problema é que mesmo que os remadores se organizem de forma que a produtividade do grupo atinja altos índices eles não estariam livres do chicote, pois este é o único instrumento motivador conhecido. Além do mais o chicoteador precisa dar suas chicotadas, não importando como o trabalho está sendo desenvolvido, visto que ele não sabe trabalhar de outra forma e precisa garantir o seu emprego reforçando a importância da sua função.

Pode parecer uma comparação grosseira, mas muitos daqueles que gerenciam pessoas e processos pensam e agem dessa forma. Acreditam que só podem ter um pouco de tranquilidade ou consciência do dever cumprido se estiverem chicoteando seus colaboradores, não importando a forma como desempenham suas funções. Tal procedimento transforma os subordinados em pessoas defensivas que gastam a maior parte das suas energias imaginando formas de se defender das chicotadas inevitáveis, o que é um tremendo desperdício do talento que cada um carrega consigo. Em vez de ficarem preocupados com as chibatadas, os trabalhadores poderiam concentrar suas capacidades na otimização de todo um conjunto de processos para alcançar a eficácia organizacional. Só que para o administrador arcaico seria terrível o fato da inexistência diária de confusões, de não ver o dia inteiro seus subordinados pulando feito pipoca e apagando intermináveis incêndios. Esse clima destemperado dá a esse administrador a sensação de que seu pessoal está fazendo por merecer o salário que recebem ao final de cada mês.

Essa concepção provinciana demonstra uma mentalidade primitiva daqueles que exercem essa prática, resquício de um tempo que ficou perdido lá atrás. E o mais incrível é que tal comportamento é visto com naturalidade por muitos gestores, arregimentando mais e mais seguidores desse regime, desconsiderando assim uma forte rejeição dos trabalhadores ao autoritarismo.

O administrador carrança não compreende que sua função é buscar meios de obter a eficiência e eficácia organizacional. Ou seja, garantir o cumprimento dos procedimentos e atingir as metas contidas no planejamento da empresa. E administrar de forma fluida evitando o desgaste exagerado das pessoas, visto que os desequilíbrios comprometem a produtividade condenando os integrantes do grupo de trabalho à mediocridade, tirando-lhes a esperança de crescimento profissional. Além do mais, o ambiente insalubre resultante de circunstâncias rocambolescas tolhe toda e qualquer iniciativa que porventura possa brotar dos indivíduos das camadas menos privilegiadas da hierarquia. Isso, evidentemente, castra o progresso de todos sem que haja uma consciência generalizada de que as pessoas envolvidas no processo nutrem-se de um mesmo organismo, que é a empresa. Dessa forma, o bom senso recomenda que a postura geral do conjunto deveria ser orientada para tornar esse organismo forte e produtivo. Infelizmente, o modelo de gestão arcaico tente a permanecer inalterado enquanto tudo estiver funcionando, não importando se aos trancos e barrancos.

Porém, quando num dado momento todos começarem a sentir que estão sendo engolidos por uma força que mal permite consciência do seu caráter, as pessoas cairão em si e concluirão que toda uma cultura precisará ser modificada. Farão isso porque as ameaças advindas de mudanças econômicas, culturais, tecnológicas, conceituais etc., pressionam a organização, arremessando-a numa arena de disputas sangrentas pela sobrevivência onde somente instituições com alto grau de adaptabilidade não são pulverizadas.

A estratégia dos vencedores concentra-se muito na concepção de que os elementos e etapas do processo devem funcionar como engrenagens fortes e precisas, atuando como um bloco, para só assim fazer frente aos concorrentes. É importante frisar que atualmente a excelência não ganha mais o jogo – só permite jogar. É evidente que para a viabilização de um modelo de negócio bem sucedido é necessário e fundamental que seja feita uma revisão crítica de toda uma cultura sedimentada sobre anos e anos de chicotadas. Agora, a organização depende de todo o potencial criativo e produtivo que seus colaboradores puderem desenvolver e que o chicote não consegue extrair.

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